MP Federal aponta interferência de Bolsonaro, e juiz envia para o STF caso do ex-ministro Milton Ribeiro

MP Federal aponta interferência de Bolsonaro, e juiz envia para o STF caso do ex-ministro Milton Ribeiro

O juiz Renato Boreli, da 15ª Vara de Justiça Federal de Brasília atendeu a pedido do Ministério Público Federal e enviou para o Supremo Tribunal Federal a investigação sobre o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro. O MP fez o pedido por enxergar indício de que o presidente Jair Bolsonaro pode ter interferido na investigação. No STF, a relatora será a ministra Cármen Lúcia.

O MPF justificou o pedido com base em interceptações telefônicas de Milton Ribeiro que indicam a possibilidade de vazamento das apurações do caso. Segundo o MPF, há indícios de que houve vazamento da operação policial e possível interferência ilícita por parte do Bolsonaro (veja a transcrição mais abaixo).

"Outrossim, nesta oportunidade, o MPF vem requerer que o auto circunstanciado nº 2/2022, bem como o arquivo de áudio do investigado Milton Ribeiro, que aponta indício de vazamento da operação policial e possível interferência ilícita por parte do residente da República Jair Messias Bolsonaro nas investigações, sejam desentranhados dos autos e remetidos, de maneira apartada e sigilosa, ao Supremo Tribunal Federal", escreveu o Ministério Público.

Operação deflagrada pela Polícia Federal na quarta-feira (22) prendeu o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro e pastores com influência dentro do MEC. A suspeita é que eles façam parte de esquema que liberava verbas da pasta para projetos em municípios em troca de propina.

Ribeiro, os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura e demais presos na operação foram soltos na quinta (23), por determinação judicial.

 

Conversas telefônicas

 

Veja abaixo transcrições de conversas telefônicas de Milton Ribeiro, gravadas com autorização da Justiça. Esses trechos estão na decisão do juiz Boreli. Segundo o MPF, as conversas levantam indícios de que o ex-ministro foi avisado sobre a operação com antecedência e de que houve interferência.

O juiz Boreli escreveu que, nas conversas, "foi possível vislumbrar eventual conhecimento das apurações com contornos de interferência".

Conversa de Milton Ribeiro com uma pessoa identificada como Waldomiro:

MILTON RIBEIRO: Tudo caminhando, tudo caminhando. Agora... tem que aguardar né.... alguns assuntos tão sendo resolvidos pela misericórdia divina né...negócio da arma, resolveu... aquele... aquela mentira que eles falavam...que os ônibus estavam superfaturados no FNDE... pra... (ininteligível) também... agora vai faltar o assunto dos pastores, né? Mas eu acho assim, que o assunto dos pastores... é uma coisa que eu tenho receio um pouco é de... o processo... fazer aquele negócio de busca e apreensão, entendeu?

Conversa de Ribeiro com uma pessoa identificada como Adolfo:

MILTON: (...) mas algumas coisas já foram resolvidas né... acusação de que houve superfaturamento... isso já foi... agora, ainda resta o assunto do envolvimento dos pastores, mas eu creio que, no devido tempo, vão ser esclarecidos....

Conversa com um familiar:

MILTON: Não! Não é isso... ele acha que vão fazer uma busca e apreensão...em casa... sabe... é... é muito triste. Bom! Isso pode acontecer, né? se houver indícios né...

LEIA TAMBÉM

 

Manifestação da defesa

 

Em nota, a defesa de Milton Ribeiro diz que recebeu com "surpresa" a notícia do envio do caso para o STF.

"O advogado Daniel Bialski, que patrocina a defesa do ex-ministro Milton Ribeiro, esclarece que recebeu com surpresa a decisão judicial de remessa dos autos da investigação contra seu cliente novamente para o Supremo Tribunal Federal", escreveu a defesa.

"Observando o áudio citado na decisão, causa espécie que se esteja fazendo menção a gravações/mensagens envolvendo autoridade com foro privilegiado, ocorridas antes da deflagração da operação. Se assim o era, não haveria competência do juiz de primeiro grau para analisar o pedido feito pela autoridade policial e, consequentemente, decretar a prisão preventiva", completou o advogado.

 

Ribeiro não foi transferido para Brasília

 

Milton Ribeiro consegue habeas corpus e deixa prisão; delegado revela interferência da PF

Milton Ribeiro consegue habeas corpus e deixa prisão; delegado revela interferência da PF

No pedido à Justiça, o MPF também destaca, como indício de interferência, o fato de Ribeiro não ter sido transferido para Brasília após ter sido preso. Ele ficou em São Paulo, apesar de a decisão judicial que autorizou a operação ter determinado a ida para a capital federal.

"Registre-se também que há indícios de igual interferência na atividade investigatória da Polícia Federal quando do tratamento possivelmente privilegiado que recebeu o investigado Milton Ribeiro, o qual não foi conduzido ao Distrito Federal (não havendo sido tampouco levado a qualquer unidade penitenciária) para que pudesse ser pessoalmente interrogado pela autoridade policial que preside o inquérito policial, apesar da farta estrutura disponível à Polícia Federal para a locomoção de presos", escreveu o MPF.

O MPF ressaltou ainda que a permanência de Ribeiro em São Paulo prejudicou as investigações.

Essa suposta interferência também foi mencionada nesta quinta-feira (23) em uma mensagem do delegado da PF responsável pelo caso, Bruno Calandrini.

A mensagem não é citada pelo Ministério Público no inquérito. Mas, nela, dirigindo-se aos colegas da PF, Calandrini disse que o ex-ministro teve tratamento diferenciado ao ser levado, depois de preso, para São Paulo e não para Brasília, como deveria ter sido pela ordem judicial.

 

 

Via G1.